27 setembro 2007

Eu sou mais coitadinho que tu!

Isto tá bonito, tá...

Já se sabe como são os portugueses quando uma equipa ou um atleta qualquer consegue um resultado de relevo. São os maiores e toda a gente gosta deles.

O problema é quando há duas equipas a conseguir feitos históricos quase em simultâneo. Tá o caldo entornado.

Eu explico. Portugal conseguiu apurar-se pela primeira vez para um campeonato da Europa em basquetebol. E também conseguiu apurar-se pela primeira vez para um campeonato do mundo em rugby. E pronto, agora ninguém os cala.

Durante o campeonato da Europa de basquetebol não faltaram adeptos furiosos porque o rugby só dá na Sport TV e o basquete dá em canal aberto. Que é uma vergonha, que não se admite, que os do rugby até são amadores, o que torna o seu feito ainda mais extraordinário.

Agora, com a cobertura mediática acerca da selecção de rugby vêm os outros, os adeptos do basquetebol, a dizer que não se compreende, que é um escândalo, todo este aparato em torno de uma selecção que até perdeu os jogos todos e por muitos. Ao menos no basquetebol ainda ganhámos 2 jogos. Os do basquetebol é que conseguiram um feito extraordinário e ninguém fala nisso.

Bom, a amnésia de uns é equilibrada pela falta de senso dos outros e estamos empatados. Quando ao valor dos feitos históricos...

Não percebo como se pode comparar um campeonato europeu com 16 equipas e duas fases de grupos (na primeira fase só ficaram de fora os últimos de cada grupo) com um campeonato mundial com 20 equipas e em que apenas os 2 melhores de cada grupo são apurados. Também não percebo como se compara um desporto em que um resultado de 90-60 é uma grande cabazada com outro em que ganhar 32-17 como a Irlanda fez com a Namíbia é uma vitória tangencial. E não percebo como é que uns adeptos louvam o amadorismo como se fosse uma das maiores virtudes do mundo (logo a seguir à humildade e à modéstia, claro) e os outros gabam a diferença de estaturas alegando que por serem baixinhos têm mais mérito. Ah, e que os jogadores do rugby são todos uma cambada de betos, cheios de dinheiro e que a modalidade em Portugal é um jogo de gente rica.

Não percebo esta mania de gritar "eu sou mais coitadinho que tu" para conseguir ficar mais bem visto. Tá bem, tá bem, são todos uns coitadinhos, assim tá melhor?

Mas para aplacar alguns ânimos mais exaltados, diga-se que:

1. As transmissões de serviço público são decididas por decreto lei com um ano de antecedência; estava-se longe de imaginar que Portugal alguma vez conseguiria apurar-se para o mundial; conseguido o apuramento é preciso contar com a boa vontade da Sport TV para transmitir os jogos de Portugal em canal aberto e eles não a tiveram (E fizeram bem, os direitos de transmissão custaram-lhes uma fortuna). O basquetebol tem muito mais expressão em Portugal e por isso considerou-se que o campeonato da europa era serviço público (além de que custa muito menos comprar os direitos; o Campeonato Mundial de Rugby é um dos eventos desportivos mais televisionados do mundo!). De qualquer maneira dificilmente se pode alegar má fé do governante por não ter adivinhado um apuramento histórico e contra todas as probabilidades com mais de 6 meses de antecedência. É preciso fazer escolhas porque se optamos por transmitir TODOS os eventos desportivos vem a seguir os intelectuais reclamar que a RTP2 é uma Sport TV dos pobres.

2. Se Portugal no europeu ficou em 9º lugar, no mundial de Rugby só estão 9 equipas europeias o que empata a situação em termos de prestígio.

3. Se em basquetebol conseguimos uma vitória história (contra a Letónia; contra Israel só fica surpreendido que não acompanha a modalidade, foi a nossa 3ª ou 4ª vitória consecutiva contra eles), o nosso ensaio contra a Nova Zelândia deve ter sido visto por mais pessoas que as que viram todos os jogos o europeu de basquetebol juntos!

4. Se ser amador é uma virtude e ser baixinho também, então não percebo a euforia com o Nelson Évora nem o Obikwelu (ambos grandes calmeirões e profissionais); se calhar o Obikwelu com a prata nos JO e o Évora com o ouro nos mundiais "não fizeram mais que a sua obrigação".

Eu não sou nem grande fan de basquetebol nem de rugby. Não sei sequer a totalidade das regras de nenhum dos desportos e não percebo quase nenhuma falta. Vi todos os jogos que pude de uma e outra prova: no basquetebol vi o jogo com a Espanha, parte do jogo com a Letónia e o jogo com Israel; no rugby vi os jogos contra Escócia e Nova Zelândia e parte do jogo com a Itália; os que não pude ver, acompanhei na net. Não tenho Sport TV, por isso tive de arranjar maneira de ir para um sítio com Sport TV ver os jogos. Fui e não me queixo. Também não tenho possibilidade de ver jogos em horário de expediente, mas contra a Grécia saí às 18:30 do escritório (a hora a que acaba o meu horário) e fiquei pregado à TV do café até ao fim do jogo e só depois fui para casa.

Acho que os do basquetebol são uns herois, merecedores de grandes honras, destaques na comunicação social e de melhores apoios para continuar a desenvolver a modalidade.

Acho que os do râguebi são uns herois, merecedores de grandes honras, destaques na comunicação social e de melhores apoios para continuar a desenvolver a modalidade.

4 comentários:

Ana disse...

Ah, finalmente percebi a taça da liga!!! ganha o mais coitadinho, não é??? =)

o RAP tb fala do rugby na sua crónica da visão da semana passada. Mas confesso que gostei muito mais da crónica da tua visão.

Anónimo disse...

Sábio comentário...
Miguel

Anónimo disse...

O Miguel anterior não é nenhum dos que conheces pessoalmente; é só um dos que vem ler o Ó faxabor.
Miguel

Nelson disse...

Ah, deixa tar. A maior parte dos comentadores eu não os conheço pessoalmente. E nem conheço assim tantos "Miguéis".