09 abril 2007

Insuficiências da língua portuguesa

Existem toneladas de palavras para descrever características humanas e grupos de pessoas que partilhem essas características, quer sejam características físicas, religiões, posições políticas, orientações sexuais, condição socio-económica, grau de literacia, habilitações académicas, profissões, etc.

Nalguns casos há dois tipos de palavras: as politicamente correctas, que podem ser usadas em quase qualquer ocasião, e as politicamente incorrectas, tipicamente usadas com sentido pejorativo e que devem ser evitadas em determinadas situações, nomeadamente em documentos oficiais ou na presença dos visados.

O problema é que nalguns casos não há termos pejorativos em quantidade suficiente para esclarecer qualquer pessoa do real sentido de uma determinada frase.

Por exemplo: se eu disser negro, referindo-me a uma pessoa de cor, ninguém acha que esteja a tentar insultar seja quem for. Posso referir-me à "população negra da Amadora" em segurança, mesmo no centro da Amadora. Contudo, se disser "os pretos da Amadora" já corro o risco de ser riscado com lâminas metálicas afiadas no meu abdomen.

Se disser sobre alguém que "é gay", por exemplo referindo-me a um colega de trabalho, tou apenas a referir-me à sua orientação sexual, sem segundos significados. Ai de quem disser que o mesmo colega de trabalho é bicha (mesmo que venha trabalhar vestido de Carmen Miranda). Aí está patente a homofobia do sujeito e arrisca-se a ter problemas.

Já os monhés, aliás, os indianos, é a mesma coisa. Dizer "quéfrô" ou "monhé" é ofensivo e um gajo arrisca-se a ser acusado de racismo, mas se disser "indiano" tá tudo bem.

Até para chulo existe um termo que pode ser usado sem ofender: proxeneta!

O problema não são estes, estes casos são simples. O problema são aqueles grupos que não têm termos ofensivos que possam ser usados para ofender. Por exemplo, judeu, democrata cristão, engenheiro ou maratonista (imaginem que querem ofender toda a gente que corre maratonas; que palavra é que usam? não há nenhuma, é o que é!)

Se um gajo usar a palavra "judeu" para catalogar alguém como é que podemos saber se a pessoa queria ofender ou não? Por exemplo, o Filipe Moura referiu-se a uma determinada pessoa como racista judia. Até parece que é verdade, a senhora é racista e é judia. E apareceu muita gente a mostrar-se ofendida com a frase. Lá está, devia haver uma palavra pejorativa para judeu. Se houvesse tava tudo esclarecido: usava-se a palavra "judeu" e não havia ofensas, usava-se o termo pejorativo e a malta podia exigir que o Filipe fosse queimado na praça pública. É como dizer "preto racista". Esta expressão é ela própria racista. Mas se eu disser "negro racista" ou "pessoa de cor racista" não há problema nenhum. Aí estou apenas a explicitar a etnia da pessoa e a mencionar o facto de que é racista. Se eu disser "negro filho de uma meretriz" não estou a ofender ninguém, já que uso as palavras politicamente correctas. Cai o Carmo e a Trindade se eu porventura disser "o preto fez uma grande corrida", referindo-me ao Lewis Hamilton, piloto da Maclaren e o primeiro preto na história da Fórmula 1 que já mostrou soberbas qualidades de condução (e já conquistou a minha admiração). Eu até podia dizer "o preto vai ser o novo Schumacher" que estaria a ser, obviamente, racista.

Eu acho que devíamos lutar contra estas limitações da língua portuguesa e inventar insultos novos para que as outras palavras fiquem com o seu sentido devidamente esclarecido.

3 comentários:

Filipe Moura disse...

:)
Não creio que seja só da língua portuguesa! No entanto, e infelizmente, "judeu" foi durante muito tempo considerado pejorativo por si só em português e castelhano. Como "galego".
(Allez Beira Mar!)

Rantas disse...

Marrano!

É engraçado verificar que o que é ofensivo numas línguas não o é noutras. Por exemplo, preto vs. negro, em Portugal, inverte-se nos EUA - black vs. nigger. Uma coisa semelhante se passaria com os polacos, se em português houvesse um termo pejorativo para eles. Em inglês, "polac" é insulto do pior - lembras-te do cabeça-de-atum, meathead, damn polac do genro do Archie Bunker?

Nelson disse...

Filipe: é como lagarto, também é pejorativo. :P

Rantas: quem não se lembra do Archie? :)