16 junho 2006

Mitos urbanos

Isto é com cada uma...

Recebi hoje um e-mail que alertava para os perigos do "Sodium Laureth Sulfate", que alegava ser cancerígeno e que se encontra em vários shampoos e detergentes. Eu até me lembrava de ter visto esse nome na composição já não sei de que frasco (não costumo levar revistas para o WC, por isso leio a composição dos frascos que por lá andam) e resolvi confirmar a história. Como, aliás, faço sempre que recebo "informações" destas por mail. Nada como uma pesquisazita no google, ler algumas fontes, até encontrar alguma coisa fidedigna que permita chegar a uma conclusão.

A mensagem diz o seguinte:

>MAIS UM PRODUTO A EVITAR PARA A NOSSA BOA SAÚDE!
>
>Devem procurar o nome do composto em inglês: Sodium Laureth Sulfate.
>
>Aos produtos abaixo identificados juntam-se o gel de banho da Sanex, os
>sabonetes líquidos do Carrefour e Feira Nova (produtos brnacos) e o
>shampoo da Dove. Verifiquem se entre os ingredientes do champoo que usam
>há uma substância chamada "Lauril Sulfato de Sódio" ou LSS.
>
>Esta substância faz parte da composição da maioria dos champôs pois os
>fabricantes utilizam-na por ela produzir muita espuma a baixo custo. No
>entanto o LSS é usado para lavar chão de oficinas (é um
>desengordurante).
>
>Verifiquei que o champô Vidal Sassoon não tem LSS, mas outras marcas
>como: VO 5, Palmolive, Paul Michell, Organics, Revlon Flex, Dimension o
>novo HernoKlorane champô, e muitas, muitas outras, contêm esta
>substância.
>
>Ligou-se para um destes fabricantes,e foi-lhes dito que eles estavam a
>usar uma substância cancerígena. Eles concordaram com a afirmação, mas
>disseram que não podiam fazer nada pois precisavam dela para produzir
>espuma.
>
>A pasta dentífrica Colgate (bubbles) também contém LSS.
>
>Várias pesquisas têm mostrado que nos anos 80 a probabilidade de
>contrair cancro era de 1 em 8000 e nos anos 90 era de 1 em 3, o que é
>bastante grave.
>
>Espero que tomem esta advertência com seriedade e a partilhem com as
>pessoas que conhecem, talvez possamos parar de "espalhar" por aí o
>"vírus" do cancro, evitando comprar champôs que contenham o LSS-Lauril
>Sulfato de Sódio, até que os seus fabricantes tomem a providência de
>substituir este componente por outro que não prejudique a saúde dos seus
>consumidores.
>
>Por favor passem esta informação para o maior número possível de pessoas
>que isto não se trata de uma corrente, mas de uma preocupação com a
>nossa saúde."
>
>Faculdade de Ciências e Tecnologia
>Universidade Nova de Lisboa
>Dra.Catarina Roriz


Ponto prévio: Pesquisei no google o nome da assinatura e as únicas referências que encontrei foram em blogs que citavam esta mesma mensagem. É estranho porque as universidades mantêm devidamente actualizada a base de dados de docentes e investigadores facilmente pesquisável pelo Google. Mas isso não quer dizer nada, pode ser que a UNL não tenha a sua base de dados pública para robots como os do Google.

Então, pesquisei por Sodium Laureth Sulfate.

Encontrei várias referências interessantes: para começar, a primeira alerta para os referidos perigos e até cita (embora não inclua os links para os respectivos sites) estudos oficiais.

Mas depois, começa a epopeia: segundo o Urban Legends a história é um mito que circula desde 1998 (vejam a secção de perguntas e respostas). Talvez não conheçam o Urban Legends mas é idóneo. Já pesquisei dezenas de histórias lá e todas as que são identificadas como mitos foram mais tarde confirmadas por fontes oficiais, pelo que confio na informação do site. Aconselho-vos a não tomar a minha palavra por lei e a conduzir a vossa própria pesquisa. Depois, temos a informação da Wikipedia que também refere que os efeitos cancerígenos são um mito. Ok, parece ser mito mesmo, mas a wikipedia não é uma fonte 100% fiável, como já foi provado antes. Mas tem o bom hábito de incluir links para as referências que cita. Uma delas é um comunicado da Cosmetic, Toiletry and Fragrance Association uma associação de produtores de cosméticos, detergentes e afins. Ok, estes gajos até podem ser sérios, mas são parte interessada na história, por isso não acredito neles. A Philip Morris continua a dizer que não há grandes provas da relação entre tabagismo e cancro do pulmão. Como a Wikipedia diz que a American Cancer Society também nega a história, resolvi procurar no site deles e encontrei isto. Pronto, agora estou satisfeito. Posso concluir que a história é um mito urbano, daqueles que gruda e não desgruda.

Quando receberem mensagens destas, sejam apelos para ajudar alguém ou alguma associação, alertas para crimes e coisas horrorosas, perigos de saúde, novos virus informáticos, e demais histórias mirabolantes (lembro-me de uma que dizia que os operadores iam ter de devolver o IVA dos SMS enviados dentro da mesma rede, que também era mito), façam uma coisa: antes de fazer forward a toda a gente que conhecem, pesquisem primeiro no google. Procurem até encontrar uma fonte de confiança (blogs que citam exactamente a mesma mensagem NÃO são de confiança). E só re-enviem a mensagem se a história for confirmada por gente idónea (sites de órgãos de comunicação social, instituições governamentais, etc). Se conseguirem desmantelar o mito, publiquem o desmentido. Respondam à pessoa que vos enviou a mensagem e digam-lhe isso mesmo. Ajudem a desconstruir estas histórias que não nos trazem nada de bom. Evitem a fuga das salas de cinema com medo de ladrões de órgãos ou seringas infectadas!

E lembrem-se: o primeiro filtro que faz disparar o alerta de mitos urbanos é a falta de links para as fontes oficiais citadas! Aquele site que fala dos perigos referidos no e-mail inclui citações de estudos oficiais mas não indica o endereço para o estudo completo. Quem não deve não teme e os links só não são indicados porque as frases são retiradas do contexto de forma a causar o alarme dando à notícia um ar oficial.

5 comentários:

João Paulo Costa disse...

Olá Nelson:

Também recebi esta mensagem há algum tempo, e decidi verificar a existência da Dra. Roriz, na UNL: fui ao site da UNL e procurei pelas suas listas de contactos de docentes: não está nessas listas nenhuma pessoa com aquele nome.

Isto é apenas para dar mais uma pequena confirmação do teor da mensagem, numa pequena investigação paralelea à que fizestes.

contradicoes disse...

Pois meu caro lamento informá-lo que também fiz a mesma pesquisa e poderá constatar pelo post que publiquei a seguir ao alerta, o respectivo desmentido. E a fonte de que me servi foi exactamente aquela a que recorreu. Por isso como vê também sei investigar
quando as duvidas me assaltam.

Nelson disse...

só é pena que a investigação tenha aparecido após a publicação no blog e não antes... mas mais vale tarde que nunca.

Anónimo disse...

Parabéns, meu caro, só o bom senso pode melhorar esta coisa dos mitos que não sei se são urbanos ou rurais, mas que se nos atravessam constantemente nas caixas de correio e insistem em provocar-nos dores de cabeça! um post muito pedagógico, o teu. Eu por mim, encontrei-o justamente porque pesquizava o tal nome da Roriz, essa investigadora fajuta... acabei por encontrar o teu post e dei-me por bastante satisfeito, seguindo os sábios links que lá deixaste!!!

Nelson disse...

Os mitos são urbanos. Definitivamente urbanos. No campo não há e-mail, não dá para propagar mitos. ;)